Dos Cavalos de Troia à Era das Franquias: uma história dos blockbusters

Dos Cavalos de Troia à Era das Franquias: uma história dos blockbusters

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Em 2019, se você quisesse levar a sua avó ao cinema em um sábado à tarde, esta tarefa não seria das mais fáceis.

Naquele ano, o fenômeno Vingadores: Ultimato entrava em cartaz em 2700 salas de cinema do Brasil, do total de 2957. Isso quer dizer que apenas 257 não exibiam a conclusão da saga do titã Thanos contra o grupo de heróis da Marvel, representando aproximadamente 90% de ocupação.

Hoje, em 2024, vemos uma relativa crise nos filmes de super-heróis, mas a permanência de várias outras grandes produções baseadas em propriedades intelectuais ainda mostra as características de uma Era das Franquias.

Os personagens e histórias marcantes nos afetos da audiência, em diferentes versões,remakes, reboots, continuações e live-actions, nos seus universos expandidos e compartilhados, acabam por guiar os projetos dos grandes estúdios. Games, brinquedos, quadrinhos e sucessos nostálgicos no passado do cinema e da TV ainda são um dos principais motivos para o público sair de casa.

Hollywood consolidou o espetáculo cinematográfico ainda nas primeiras décadas do século 20, mas somente entre os anos 70 e 80 criaria as bases do chamado blockbuster moderno. Naquela época, produções antes menos priorizadas pelos grandes estúdios, repletas de efeitos especiais e focadas em um público mais jovem, passaram a mobilizar multidões, modificando, de igual modo, as estratégias de distribuição, propaganda, investimento e expansão dos lucros com produtos.

Na direção dos filmes estavam alguns cineastas direta ou indiretamente ligados à geração da Nova Hollywood, que transformou o cinema dos EUA entre os anos 60 e 70.

Este modelo de negócio do blockbuster modificou a indústria cinematográfica, contudo, ela ainda convivia em certo grau com uma diversidade maior de gêneros de filmes e possibilidades de orçamento por produção. Seria apenas ao longo das duas primeiras décadas do século 21 o aprofundamento de uma estratégia mais monopolista, onde passou-se a buscar somente o investimento seguro, ainda que muito alto, em franquias e personagens já consolidados, ao longo dos anos, na cultura pop. 

Portanto, compreender o nascimento e desenvolvimento deste transcurso nas telas, relacionando o que ocorreu nas décadas anteriores aos dias atuais, o início do blockbuster moderno à atual Era das Franquias, pode nos dar algumas chaves para pensar o estado atual do cinema.

Este ensaio é uma tentativa de responder algumas perguntas. Para refletir sobre esta cinematografia contemporânea, muitas vezes hegemonizada por um modelo uniformizador de estratégias de mercado, tentei buscar a história de formação do blockbuster moderno e seu processo de transição para o nosso instante presente, 50 anos depois. Para isso, procurei observar os elementos importantes dentro dos processos cinematográficos, assim como as transformações da subjetividade social, das tecnologias da informação e da comunicação, dentro deste contexto.     

A investigação será feita a partir de dois textos: este aqui, o primeiro, “Dos Cavalos de Troia à Era das Franquias – Uma história dos blockbusters”; e o segundo, “A Era das Franquias”, que será publicado em breve.

O barulho das ruas

No calor da noite

Antes do boom de novos diretores da Nova Hollywood, entre os anos 60 e 70, as telas estadunidenses estavam consideravelmente atrasadas em relação às transformações culturais e estéticas vividas pelo cinema em grande parte do mundo.

Do Neorrealismo Italiano dos anos 40 e 50, passando pela Nouvelle Vague francesa, pelo Cinema Novo brasileiro e o Novo Cinema Latino-Americano dos anos 60, chegando até aos cinemas do Japão, da Suécia, da Inglaterra e de outros países, o planeta assistia a um borbulhar de novas ideias e propostas cinematográficas. Modificavam-se as formas de filmar, muitas vezes a partir do cinema independente, em sintonia também com a necessidade de retratar temáticas mais urgentes ligadas à realidade social e histórica, representando a violência, a sexualidade, os transtornos psíquicos, as desigualdades sociais e os conflitos culturais, raciais e comportamentais.

Os temas indigestos para o status quo não estavam totalmente ausentes das telas norte-americanas, mas sofriam especialmente com a pressão censora do Código Hays, um conjunto de normas criado pelos grandes estúdios, vigente entre os anos 30 e o final dos anos 60.

A censura, unida a uma subjetividade em termos gerais conservadora, fazia com que grande parte da ebulição social e cultural dos EUA não fosse representada no cinema. Enquanto os movimentos de direitos civis e a contracultura chacoalhavam as ruas, as telas ainda abrigavam produções ainda muito vinculadas às convenções do cinema clássico. Enquanto todos viam A Noviça Rebelde girando e cantando nos Alpes Austríacos, um mundo fora da sala escura vivia um inescapável devir. Mas isso iria mudar.

Peter Biskind, em seu livro Easy Riders, Raging Bullls: Como a geração sexo-drogas e rock’n’roll salvou Hollywood *, explica:

“Como os filmes são caros e demorados de fazer, Hollywood é sempre a última a saber, a mais lenta a reagir e, nessa época, estava pelo menos meia década atrás das outras artes populares. Por isso, um bom tempo se passou até que o odor acre de cannabis e gás lacrimogêneo chegasse até as piscinas de Beverly Hills e a guitarra atingisse o portão dos estúdios.”

A indústria cinematográfica já havia contornado a ameaça da chegada da televisão, buscando promover alguns diferenciais para a experiência audiovisual nos anos 50 e 60. Entre estes recursos para tirar o espectador do conforto do lar, estava a gigantesca tela do CinemaScope.

Contudo, a segunda metade dos anos 60 vivia uma crise econômica, com as grandes corporações totalmente perdidas, sem saber muito como reagir às transformações da indústria cultural e da sociedade, abrindo assim caminho para novas propostas.

Produções como A primeira noite de um homem (Mike Nichols, 1967); No calor da noite (Norman Jewison, 1967); Bonnie e Clyde (Arthur Penn, 1967); Perdidos na noite (John Schlesinger, 1969) e Easy Rider (Dennis Hopper, 1969), algumas delas inspiradas pela paixão daqueles cineastas cinéfilos por produções estrangeiras, souberam aproveitar esta brecha, gerando grande debate público e êxitos de bilheteria. Estes filmes da Nova Hollywood foram pontas de lança para o rompimento de algumas barreiras em relação às temáticas e à liberdade criativa contra o poder absoluto dos produtores, processo iniciado nos anos 60 e aprofundado nos anos 70. 

Para a importante crítica de cinema Susan Sontag,

“foi um momento muito específico nos cem anos da história do cinema, um momento em que ir ao cinema, pensar sobre cinema, falar sobre cinema tornou-se uma verdadeira paixão entre estudantes universitários e outros jovens”.

Ou, como afirmou Quentin Tarantino em seu livro Especulações cinematográficas:

“Mesmo quando não eram bons, os filmes da contracultura de 1968 a 1971 eram sempre empolgantes. E demandavam que fossem assistidos em grupo, de preferência chapado.”

Os cineastas, embebidos da política dos autores, ganharam maior independência, com os magnatas da indústria e seus produtores perdendo parte do controle total sobre os filmes. Mas, por outro lado, havia algo vantajoso para estes executivos em termos econômicos, pois vislumbrava-se a possibilidade lucrativa de realizar filmes com orçamentos bem mais baixos, junto a um satisfatório retorno nas bilheterias.

Uma série de fatores levou ao fim deste período. De um lado, a insustentabilidade de vários projetos, do outro, o ressurgimento de um modelo baseado em grandes produções.

Os meninos da TV e das matinês

Até os anos 70, em especial entre os anos 40 e 60, o cinema com mais apelo jovem existia, era popular, mas caminhava muito mais em lugares como as matinês e drive-ins. Além disso, alguns gêneros queridos da garotada, como a ficção científica, o terror, a aventura e a fantasia, tinham nos filmes B boa parte de sua produção (ainda que tivesse havido também investimentos dos grandes estúdios em alguns momentos, como nos monstros da Universal e na ficção científica dos anos 50).

Este cinema juvenil era um local de paqueras e encontro com os amigos, diferente das sessões principais, reservadas a casais adultos e famílias, com seus membros de diferentes idades. Através das telas principais e mais “respeitáveis”, eram exibidos os dramas, os épicos, os musicais, as comédias e outros gêneros priorizados pelos grandes estúdios no seu processo produtivo.

Mas, ao longo da década de 70, dois filmes de terror, O Exorcista, em 73 e Tubarão, em 75e um de ficção científica,Star Wars, em 77 (de William Friedkin, Steven Spielberg e George Lucas, respectivamente), mudariam drasticamente tanto os gêneros dos grandes sucessos, como também as práticas da indústria cinematográfica na realização, distribuição, divulgação e expansão dos lucros.

O termo blockbuster já existia. Nascido para denominar militarmente as bombas “arrasa-quarteirão”, o conceito já estava presente na crítica especializada desde pelo menos os anos 40, em comentários sobre os grandes sucessos de bilheteria. Mas somente a partir dos anos 70 o blockbuster ganharia a forma conhecida até os dias de hoje.

Lucas e Spielberg são de um recorte geracional de jovens de classe média formados, desde a infância, pela televisão, pelos quadrinhos, pela literatura pulp e pelas sessões cinematográficas de filmes e seriados. Eles são também exemplos clássicos dos assim denominados movie brats, termo criado pelo autor Michael Pye para descrever esta geração da Nova Hollywood, especialmente em relação à influência da cinefilia e das faculdades de cinema.

Frances Ford Coppola, uma espécie de centro aglutinador da Nova Hollywood, possuía cinco ou seis anos de diferença em relação a Spielberg e Lucas, mas as diferenças em seus históricos de vida e formação os faziam ser de galáxias totalmente distantes, conforme conta Peter Biskind.

Coppola foi o grande incentivador de Lucas e de vários outros cineastas da época. Mas o diretor de O Poderoso Chefão era um homem do livro, do teatro, da cultura escrita, diferente daqueles jovens criados por um universo pop, naquilo que hoje mais comumente atribuímos o nome de nerds. Assim como Martin Scorsese, Coppola havia crescido em Nova York, refletindo em sua arte muitos dos anseios de uma agitada vivência urbana, algo muito familiar à Nova Hollywood. Já Spielberg e Lucas são fruto de famílias tradicionais dos subúrbios, justamente o “american way of life” visto como ponto a ser alvejado pelo discurso cinematográfico da geração rebelde que transformaria o cinema nos EUA.

“Eu queria ser qualquer pessoa menos eu mesmo”

Steven Spielberg é um diretor-chave para a compreensão destas mudanças. Não chegou a vivenciar uma relação profissional direta com os arquitetos da Nova Hollywood, como seu colega George Lucas, mas possuía uma aproximação afetuosa com aqueles cineastas. Além disso, trazia em seu espírito a típica cinefilia e vontade de transformar a indústria, comum naquela geração.

Entretanto, foi justamente seu primeiro grande hit, Tubarão, o responsável por iniciar, de forma mais completa, a construção do blockbuster moderno, aprofundando muito a largada que já havia sido dada pelo fenômeno O Exorcista, de William Friedkin, em 1973.  

Spielberg, um jovem diretor cujo início da carreira havia sido na televisão, foi o responsável por adaptar para a Universal o best-seller Tubarão, de Peter Benchley. Ainda em dificuldades com o seu projeto Contatos Imediatos do Terceiro Grau, que só sairia dois anos depois, em 1977, o diretor leu o romance em uma semana, pedindo para dirigir o longa.

Porém, logo depois de ter topado, o diretor não tardou em começar a apresentar algumas reservas com o trabalho. Spielberg considerava a proposta “comercial demais”. Como mostra Peter Biskind, não sabia mais quem ele mesmo era: “Queria fazer um filme que deixasse uma marca não nas bilheterias, mas na consciência das pessoas”. Spielberg não gostaria de ser conhecido como “um diretor de tubarões e caminhões”; esta última uma referência à sua promissora estreia nos longas, com o suspense Encurralado, de 1971.  

Dentro destes dilemas, sua saída foi tentar não se limitar a repetir convenções narrativas, mas produzir uma nova perspectiva sobre o cinema de gênero, semelhante ao que Coppola havia feito poucos anos antes com os filmes de gângster, em O Poderoso Chefão e William Friedkin com o cinema de terror, em O Exorcista. Para Peter Biskind, ele desejava produzir a reinvenção de formatos clássicos a partir dos inovadores olhares da Nova Hollywood. Entre as insistências de Spielberg para diferenciar sua obra, estava a necessidade de filmar no mar aberto real, não em uma piscina de estúdio.

Como já é bem conhecido, Tubarão sofreu com inúmeros reveses, como estouro de orçamento e cronograma, naquele roteiro de bastidores tantas vezes visto, de uma produção caótica e fadada ao fracasso, mas que acaba se tornando ao final um grande sucesso.

Um dos problemas era o pouco realismo transmitido pelo grande vilão, um tubarão mecânico feito de borracha. Segundo o produtor Rob Cohen, a solução para esta debilidade técnica foi encontrada pela montadora Verna Fields: “Ela começou a perceber que aquilo que se imagina é pior do que o que se vê”. Portanto, na edição, “meteu a tesoura, arrancou tudo o que tinha tubarão e deixou só o resultado, as reações”.

Entretanto, segundo a versão de Spielberg, já no processo de produção ele havia percebido esta necessidade: “Os efeitos especiais não funcionavam, então eu tinha que pensar rápido e fazer um filme que não dependia dos efeitos para contar a história”.

Carl Gottlieb, um dos colaboradores do roteiro, lembra que o filme de terror O Monstro do Ártico foi uma das referências para a equipe. Naquele grande sucesso de 1951, baseado em um conto da revista pulp Astounding Science Fiction (e refilmado por John Carpenter em 82, com The Thing), o monstro somente aparecia no último rolo de película, mantendo no espectador o suspense sobre o vilão até o final.

“Joguei fora a maior parte dos meus storyboards e apenas sugeri o tubarão. Meu filme foi de William Castle para Alfred Hitchcock”, disse Spielberg.

Tubarão- Copyright by Universal Studios 

A referência um tanto depreciativa cita William Castle, um dos maiores realizadores de filmes B entre os anos 40 e 70. Além de diretor e produtor, ele era responsável por sessões cheias de criativos mecanismos para maximizar a tensão e o pavor dos espectadores, em uma espécie de Casa do Terror ou Trem Fantasma dentro da sala de cinema. 

É curioso observar como Spielberg usa o nome de Castle, em uma comparação com Hitchcock, cineasta que por sua vez já era respeitado e reconhecido com um verdadeiro autor dentro do cinema. Existe aqui a complexidade pessoal de Spielberg, que por um lado cresceu inspirando-se em filmes de gênero, inclusive marca de vários de seus filmes amadores da juventude, mas que ao mesmo tempo era inseparável do espírito de seu tempo, naquela atmosfera cinéfila e autoral da Nova Hollywood.  

Spielberg gostaria de ser como Scorsese ou Antonioni: “Eu queria ser qualquer pessoa menos eu mesmo”, relembraria, anos depois, revelando uma busca de identidade cinematográfica e pessoal.

Estas ambivalências são muitos semelhantes às vividas por George Lucas, em um Star Wars de 1977 umbilicalmente ligado à ficção científica pop de Flash Gordon, mas que também presta tributo à sofisticação estética e filosófica dos samurais de Akira Kurosawa, junto a uma série de metáforas políticas daqueles conturbados anos 60 e 70. 

Embora bem mais moderado que muitos de sua geração, Lucas tinha um importante senso de antiautoritarismo. Isso está refletido nos seus rebeldes de Star Wars contra um Império inspirado na Era Nixon, ou mesmo nos eowkse suas armas rudimentares, que poderiam ser tanto vietcongues e guerrilheiros das resistências ao redor do mundo, como os próprios jovens cineastas da Nova Hollywood contra a imposição dos estúdios.

A contracultura da época também pode ser percebida na influência sofrida por George Lucas durante a leitura do autor peruano Carlos Castañeda, sucesso na época, transformando o sábio personagem Don Juan Matus, pertencente à etnia Yaqui, de Sonora, México, no mestre jedi Obi-Wan Kenobi.

A estreia de Lucas nos longas havia sido seis anos antes, em 1971, com THX 1138, distopia futurista baseada no seu curta da faculdade de cinema. O filme foi produzido em uma parceria da Warner com a Zoetrope, produtora liderada por Francis Ford Coppola, com participação de Lucas, mas que fluía numa dinâmica próxima às dos coletivos culturais típicos dos anos 60 e 70.

A paixão pela ficção científica, em seu longa, unia-se à sua perspectiva de olhar crítico e pessimista sobre o mundo. O fracasso de THX nas bilheterias, em uma distribuição bem limitada, o decepcionou profundamente. Nas palavras do amigo e roteirista Matthew Robbins, “George acreditava que tinha feito um filme que, além de visualmente interessante, também era sobre alguma coisa importante”.

A sugestão do amigo Coppola para Lucas foi tentar fazer algo “que não seja tão esquisito”, “alguma coisa mais humana”.  

A necessidade de ter um sucesso comercial deixava o jovem cineasta amargurado, mas ao mesmo tempo o desafiava, como lembrou Peter Biskind. Na visão de George Lucas, Hollywood estava deixando de lado considerável parte de seu público, já cansado do pessimismo e da intensidade sexual e violenta da Nova Hollywood:

“Todos nós sabemos, e todos os filmes feitos nos últimos dez anos já mostraram, que somos horríveis, que estamos errados por nos meter no Vietnã, que destruímos o mundo, que somos uns imbecis e tudo está podre. Ir ao cinema estava se tornando deprimente. Decidi que era hora de fazer um filme do qual as pessoas saíssem se sentindo melhor do que quando entraram no cinema.”

O resultado daquelas indagações foi Loucuras de Verão (American Graffiti), de 1973, com um tema bem conhecido de Lucas: a vivência de jovens em uma cidade pequena do interior, em 1962. A produção, com apoio da Universal, ficou novamente a cargo de Coppola e sua Zoetrope, junto à recém criada LucasFilm, produtora que acabaria sendo um dos símbolos do blockbuster moderno e, décadas mais tarde, importante também para a Era das Franquias.

Embora não desprovido de um ar melancólico, típico da transição da juventude para a vida adulta, seu novo longa possuía grande apelo popular. Além das vivências pessoais, Lucas também tinha Os boas vidas, de Frederico Fellini como referência, algo revelador do seu inseparável lado cinéfilo. Feito com um orçamento bastante limitado, Loucuras de Verão acabou sendo um grande sucesso de público, mudando definitivamente os rumos da carreira de George Lucas.

O diretor concluiu que estava indo no caminho certo. Se Loucuras de Verão focava na juventude, agora gostaria de voltar ainda mais no recorte etário, caminho que o levaria a Star Wars:

“Talvez eu deva fazer um filme para uma garotada mais jovem. (…) Eu vi que as crianças de hoje não têm um mundo de fantasia como nós tínhamos – não têm faroestes, não têm filmes de pirata… esse tipo de aventura de verdade, na linha de Errol Flynn, John Wayne. (…)”

Em um longo processo, incluído aí dois anos e meio da escrita do roteiro, Lucas conseguiu algo muito difícil: convencer o financiamento, por parte da Fox, de um projeto caro, sem atores conhecidos e de um gênero desprestigiado pelos estúdios. A conclusão foi a realização de Star Wars, grande sucesso de bilheteria e a consolidação do que Spielberg havia feito em Tubarão, criando bases ainda mais perenes do modelo-padrão para um blockbuster.    

Os Cavalos de Troia

Naquela época, a televisão não era utilizada para promover os filmes, pois era vista muito mais como um meio concorrente do que como um instrumento em benefício do cinema. Contudo, dois anos antes de Tubarão, a Columbia havia realizado o experimento de divulgar televisivamente, de forma regional, uma produção B chamada As novas aventuras de Simbad. O êxito do empreendimento levou o estúdio a realizar o mesmo, agora nacionalmente, com Fuga audaciosa, ação estrelada por Charles Bronson, transformando um filme com baixas expectativas em um sucesso.     

Era a deixa necessária para a Universal, em 1975, abrir definitivamente esta clareira, com um gasto, até então inédito, de 700 mil dólares em propaganda para a TV no lançamento de Tubarão.

Algo muito semelhante ocorreu em relação à distribuição. Os lançamentos antes eram regionalizados e focados, não massivos como ocorrem até hoje, com o filme chegando a várias salas ao mesmo tempo. Continuando uma trilha já iniciada por O Poderoso Chefão e O Exorcista, Tubarão foi lançado em 409 cinemas dos EUA. Ao contrário do que costumava acontecer, o lucro aumentava a cada nova semana quebrando recordes, a partir do crescimento do número de salas de exibição, indo de mil para dois mil e mais ainda nas décadas posteriores.

Dois anos depois, ainda durante a produção de seu Star Wars, George Lucas insistiu em ter direitos sobre as vendas dos discos com a trilha sonora, merchandising e outros produtos licenciados. Até aquele momento, este tipo de mercado era algo pouco levado sério na indústria. Um brinquedo demorava cerca de 18 meses para ser criado, fabricado e distribuído, algo inadaptável aos cronogramas dos filmes. Além disso, a indústria acreditava que o público normalmente não se lembraria mais dos personagens tempos depois do lançamento.

O sucesso estrondoso de Star Wars, trazendo uma audiência quase religiosa em torno da obra, transformou todo o jogo. O resultado foram toneladas de brinquedos, discos, livros e várias bugigangas vendidas para um fandom nascente, responsável por mudar as relações de um público apaixonado com os personagens e universos dos filmes de sua paixão, concomitantemente elevando, a níveis estratosféricos, a possibilidade de lucro das corporações.

Em uma analogia fílmica precisa sobre aquele instante, Peter Biskind lembra do momento em que Darth Vader, em O Império contra-ataca, roga a Luke Skywalker para juntar-se a ele no Império e no lado negro da força: “Luke, é o seu destino!”, alegava o vilão, algo que o herói, obviamente, nega-se a fazer.

Contudo, como afirma Biskind: “a vida real é diferente. (…) Quando o império que Lucas criou pediu-lhe que o servisse, ele cedeu”. 

Na reflexão de Lucas: “Demorou muito tempo para que eu me ajustasse a Star Wars, mas finalmente consegui, e vou voltar. Star Wars é meu destino.”

Um importante marco do fim da Nova Hollywood foi o fracasso do filme Portal do Paraiso, de 1980. O diretor Michael Cimino, oriundo do sucesso de O Franco Atirador, teve a liberdade criativa que havia sido conquistada pelos cineastas da sua geração, mas produziu um prejuízo histórico para a United Artists.

A ideia romântica de um diretor sem freios, lutando por suas ideias e seu projeto, mas que ao final consegue provar sua razão, parecia chegar ao fim. Os anos 80 trariam de volta os produtores e executivos para dar as cartas e os estúdios. Como afirma Biskind, estas empresas passaram a se assemelhar a qualquer outra grande corporação.

O Portal do Paraíso

O sucesso do modelo blockbuster aumentou muito os custos de produção, incluindo agora um investimento bem maior em marketing. Roger Corman, diretor de filmes B de gênero e grande apoiador do início da Nova Hollywood, chegou a queixar-se de que o tipo de filme que costumava realizar “por uma ninharia” agora possuía um orçamento de muitos milhões de dólares.

Desta forma, muitas das pequenas produtoras, dos mais diferentes gêneros e estilos de produção, não podiam se sustentar. Viu-se o poder monopolista dos grandes estúdios voltar a dar as cartas, com os diretores mais criativos, de igual modo, sendo substituídos por aqueles mais operantes e adaptáveis ao controle vindo de cima.

Como afirma Coppola: “Tínhamos a ideia ingênua de que o equipamento nos daria os meios de produção. É claro que aprendemos, muito mais tarde, que não se tratava do equipamento, tratava-se do dinheiro.” 

Segundo Peter Biskind, Spielberg foi o “Cavalo de Troia através dos quais os estúdios retomaram o poder”, algo também perfeitamente aplicável a George Lucas. A independência dos cineastas em relação ao controle tecnocrático, conquistada com muita teimosia, possibilitou a realização de filmes comerciais criativos, bem realizados e em sintonia com as aspirações da juventude, logo, garantias de sucesso. Portanto, o sábio recuo estratégico dos donos da grana acabou sendo o grande trunfo para voltar a um controle (que eles nunca haviam perdido totalmente, de fato).

Levando formigas gigantes a sério

Os violentos, rebeldes, lisérgicos e sexuais filmes da Nova Hollywood, momento de um público mais “maduro” e “adulto”, foram sofrendo gradualmente com a perda de interesse por parte da audiência. O público já estava cansado da filmografia contemporânea, daqueles conteúdos fortes e, sobretudo, do “clima de cinismo contra tudo” daquele cinema, como afirma Tarantino em Especulações cinematográficas.

Dentro deste processo, a ascensão dos nerds movie brats, como Spielberg e George Lucas, se encaixou perfeitamente nas necessidades dos estúdios. Nas palavras de Tarantino:

“Os movie brats (…) eram jovens o suficiente para ser exatamente o público que a American-Internacional Pictures estava tentando atingir. Eram jovens o suficiente para assistir a esses filmes em drive-ins. (…) Esse foi o principal motivo pelo qual os movie brats lutaram contra o zeitgeist e procuraram se distanciar dos cineastas antissistema pós-anos 60 que haviam dado início a essa Nova Hollywood na qual, agora, os mais jovens estavam se dando bem; esses diretores hippies não conseguiram entender, ou simplesmente não quiserem, era que havia pessoas capazes de assistir a filmes sobre formigas gigantes e leva-los a sério.”

Quando refletimos sobre estes períodos, é muito importante não colocar em duas gavetas separadas os elementos da subjetividade social e os aspectos econômicos. Se de um lado é correto afirmar que os filmes refletem características culturais de seu tempo, de seus realizadores e espectadores, é igualmente verdadeira a apropriação destes sentimentos por parte da indústria. O negócio, neste sentido, é ao mesmo tempo afetado pelas tendências e propagador das mesmas, buscando a maior possibilidade de extração de lucro.     

Se por um breve período da Nova Hollywood foi providencial para os estúdios o encontro com um ar fresco de novidade, a consolidação agora do blockbuster nos anos 80 era o sonho da volta de um controle mais efetivo, tal como ocorria na Era de Ouro. Por isso, o cinema lúdico e otimista, com suas crianças e adolescentes fazendo filas para as múltiplas sessões e voltando outra e outra vez; os filmes de verão e seus milhares de produtos associados, tudo isso era muito mais interessante mercadologicamente do que qualquer filme maduro e adulto dos anos 60 e 70.

Como era verde o meu gramado!

A maior bilheteria da década de 80, ET: O Extraterrestre, de Spielberg, em 82, ressalta valores positivos, como a amizade e a solidariedade, permitindo também alguns momentos mais libertários, como um Elliott embriagado soltando os sapos no laboratório da escola. Mas a mensagem central do filme de 1982 está definitivamente em torno da importância da família e do lar, tanto no menino e especialmente com o alienígena buscando a todo tempo voltar para casa: “ET, telefone, minha casa…”

Agora, nos anos 80, os idílicos anos 50 voltavam à tona de forma nostálgica, na busca por uma época vista por muitos como o último momento de paz do “american way of life”, com suas gramas verdes e famílias felizes em suas casas nos subúrbios. Para a classe-média tradicional branca, aquele era o “paraíso perdido”, logo antes da desestabilização da ordem estabelecida provocada pelos movimentos dos direitos civis, os movimentos negros, feministas, a Guerra do Vietnã (e seus protestos contra a guerra), a contracultura, as drogas e o movimento hippie.

A referência direta mais forte aos anos 50 estaria três anos depois de ET, em De volta para o futuro, de 1985, dirigido por Robert Zemeckis e contando com a produção executiva de Spielberg (onipresente nos blockbusters da época). O filme é literalmente uma viagem ao passado, aos inocentes e saudosos anos 50, antes da chegada do rock.

Gravação de De volta para o futuro

Ao final do filme, Marty McFly consegue fazer de seu pai, George, uma pessoa confiante. No passado dos anos 50, ainda jovem, o pai revida as agressões de seu bully e conquista aquela que seria posteriormente a sua mãe; Marty influi no passado, transformando o futuro. George, no presente inicial do filme, nos anos 80, passa a ser não mais o nerd desajeitado de meia-idade, mas um altivo e confiante profissional e “chefe de família”, fazendo agora, ele próprio, bullying contra um decadente vilão Biff adulto, invertendo, de certa maneira, a chave da opressão.

O pai de Marty se torna um típico yuppie, um “winner”, figura-símbolo dos executivos bem-sucedidos da neoliberal Era Reagan, de uma classe-média não mais tão preocupada com a transformação do mundo, como aquela dos anos 60 e 70, mas sim com a ascensão social pessoal em um competitivo mundo. A importância a valores como conforto, família, propriedade e prosperidade acabam por aproximar, desta maneira, os anos 80 dos anos 50, sendo uma base discursiva importantíssima para moldar as narrativas das grandes produções da época.

Continuidades e descontinuidades

Os anos 80 levaram o blockbuster, seus efeitos especiais e as altas doses de entretenimento ao topo, em filmes como ET, as trilogias De volta para o futuro, Indiana Jones e a conclusão da trilogia de Star Wars. Mas estas grandes produções de ficção científica, ação e aventura não eram os únicos nomes a estampar os cartazes das marquises.

Diferente do quadro cinematográfico mais uniforme da atualidade, ao observarmos uma lista mais ampliada das maiores bilheterias da década 80, percebe-se uma diversidade grande de gêneros e tamanhos de orçamento, em comédias como Tootsie e Um príncipe em Nova York; dramas como Rain Man e A cor púrpura; ou mesmo um filme de guerra como Platoon e uma comédia romântica como Harry e Sally.

Mesmo longe do topo das listas, longas de médio e baixo orçamento eram lançados aos montes, algo necessário para alimentar não apenas as muitas salas de cinema, mas também o grande mercado das locadoras de vídeo, assim como das emissoras de TV, abertas e fechadas. Assim, o home vídeo possibilitava uma sobrevida às produtoras menores, como por exemplo as realizadoras de filmes de terror, gerando um maior leque de tipos e tamanhos de produção.  

O quadro se repete nos anos 90, que apresenta uma leve descontinuidade nesta história. Esta década nos dá elementos suficientes para questionar uma imagem linear totalizante sobre a evolução do cinema baseado nos blockbusters e nos gêneros associados a eles.  

A dupla Spielberg/Lucas ainda está lá no topo, com Jurassic Park, de 1993 e Star Wars Episódio I: A ameaça fantasma, de 1999. Mas, entre as grandes bilheterias, há espaço ainda para uma dramédia, como Forrest Gump, de 1994 ou um terror/suspense sobrenatural como O sexto sentido, de 1999.

Mesmo a maior bilheteria e fenômeno popular da década, Titanic, de 1998, não se assemelha muito a um blockbuster tradicional dos anos 70/80. O longa de James Cameron remete, é verdade, ao cinema catástrofe (moda dos anos 70 e cujo retorno aconteceria naquela década), mas centra seu fio condutor num romance típico da Hollywood clássica, à la Tarde demais para esquecer, de 1957.    

Algo importante da época é a força do filme independente. Alguns estúdios menores e distribuidores, apoiados pela importância de festivais como o de Sundance, ganham mais relevância dentro do debate público. Estas realizações influenciam bastante as estéticas cinematográficas e se mostram também modelos de negócio viáveis, pois possuíam muitas vezes uma boa proporcionalidade entre um baixo investimento e um retorno satisfatório de bilheteria.

Cães de Aluguel, de 1992 e Pulp Fiction, de 1994, fazem de Quentin Tarantino o cineasta mais importante da década nos EUA, influenciando a linguagem pop de inúmeros filmes posteriores. São também igualmente importantes os casos de El Marichi de 1992, O balconista, de 1994 e A Bruxa de Blair, de 1999, conquistando ótimos números de bilheteria a partir de baixíssimos orçamentos (este último com o uso inovador, para divulgação, de uma internet que apenas engatinhava).

Os anos 90 mostram-se como período de transição, onde os blockbusters caminhavam lado a lado com a atmosfera mais cínica e violenta de tempos mais desesperançados, tema de muitos dos filmes independentes.

Este processo de maior diversidade cinematográfica não é apenas localizado, mas se vê em outras partes do Globo, com cinematografias de diferentes países recebendo maior atenção dos mercados internacionais e nacionais.

O Brasil, por exemplo, vivencia a época do que foi chamada de Cinema da Retomada, a partir de filmes como Carlota Joaquina, de Carla Camurati (1995), outra obra realizada com poucos recursos, numa época difícil para o cinema nacional, conseguindo resultados expressivos de público. Em quatro anos, o Brasil acaba recebendo três indicações ao Oscar de Filme Estrangeiro (O Quatrilho, 1996, O que é isso companheiro?, de 1998 e Central do Brasil, de 1999, este último vencedor do Urso de Ouro no Festival de Berlim).   

A reimaginação do heroico

Na despedida do século 20, em especial nos três últimos anos, é possível observar algumas produções representativas do que viria mais adiante, no século 21, em relação à produção de imaginários e à indústria cinematográfica, com seus blockbusters.

Em 1999, com Star Wars Episódio I: A ameaça Fantasma, George Lucas volta à sua “galáxia muito, muito distante”, na primeira parte de uma trilogia prequel, antecedendo os eventos da trilogia clássica.

Realizar continuações e outras obras derivadas não era nenhuma novidade para Hollywood, mas temos aqui a retomada nos cinemas da mais relevante franquia produtora de um universo expandido e criadora de todo um modus operandi da indústria. Após 16 anos de hiato, período onde os fãs, com seus eventos, livros, quadrinhos, brinquedos e cosplays nunca deixaram a série de filmes cair no esquecimento, tínhamos novamente um grande acontecimento de estreia.

A ponte entre os anos 70 e os novos tempos estava feita. A decepção de muitos fãs com esta trilogia (que o tempo e outros filmes terríveis posteriores provaram ser um tanto injusta) não apaga a relevância deste acontecimento. Os novos tempos não seriam mais de blockbusters isolados ou com apenas algumas continuações, mais da tentativa ad infinitum de maximização dos ganhos em torno de uma mesma franquia e seus subprodutos.      

Importantes figuras dentro do imaginário cultural, os super-heróis só haviam recebido mais atenção dos estúdios e do grande público em dois momentos pontuais até então: em Superman- O Filme, dirigido por Richard Donner em 1978 (junto às suas continuações) e a “batmania” iniciada a partir dos dois Batmans, de Tim Burton (Batman, de 1989 e Batman- O Retorno, de 1992). Embora tenham sido sucessos estrondosos, estas adaptações de personagens dos quadrinhos não chegaram a iniciar efetivamente nenhuma tendência mais relevante para outros super-herói no cinema, de forma geral.

Mas o final dos anos 90 começa a trazer indícios da importância que teriam os super-heróis no século vindouro. Blade, de Stephen Norrington, traz em 1998 a mistura de terror e ação baseada no herói caçador de vampiros da Marvel Comics, com o astro dos anos 90 Wesley Snipes como protagonista.

X-Men, de Bryan Singer, foi a oitava maior bilheteria de 2000. Criado na Marvel nos anos 60, refletindo os conflitos das lutas por direitos civis, o grupo de mutantes era naquele momento muito popular, em função também do sucesso de sua animação para a TV dos anos 90 e de alguns games. Além dele próprio ter gerado a sua franquia de filmes, vislumbrava-se a possibilidade dos super-heróis serem levados à sério dentro do planejamento dos estúdios, estratégia que seria colocado em prática, efetivamente, anos depois.

Já foi alvo de muitas análises o cinema do ano de 1999 nos EUA, com alguns filmes apresentando características em comum: a representação de homens entre a juventude e a meia-idade, brancos, de classe-média, em crises existenciais diante da vida, da sociedade, da família, das convenções sociais e, especialmente, do trabalho. Entre eles, podem ser citados Beleza Americana, de Sam Mendes Como enlouquecer seu chefe, de Mike Judgee Clube da Luta, de David Fincher.

Matrix, do mesmo ano, inicia com seu protagonista, o programador Neo, diante de uma crise pessoal com sua vida, até ser informado sobre a verdade: ele vivia, efetivamente, em uma simulação. Ao escolher a pílula vermelha do “mundo real”, oferecida por Morpheus, inicia sua viagem para uma “verdadeira realidade”, controlada por robôs, com humanos escravizados “sonhando” com um outro mundo (a realidade vivida anteriormente por Neo).  

O lugar para onde vai Neo vai é triste e sombrio, mas ao mesmo tempo é a oportunidade de uma jornada cheia de ação, aventura e ensinamentos, onde é possível, inclusive, aprender jiu-jitsu em alguns segundos. Além de ter inspirado, ao longo dos anos, efeitos especiais, coreografias de luta no cinema e sentimentos paranoicos em grupos conspiracionistas, há aqui a formação de um tipo de subjetividade que será muito importante no cinema do século 21.

Em Clube da Luta, a saída para a inconformidade do homem diante da sociedade era cair na porrada com desconhecidos, em uma sociedade secreta; já em Matrix este caminho está no mundo emocionante de ação e ficção científica apresentado pelo filme. O homem, diante de uma crise de identidade de um mundo em movimento, recorre à reimaginação do heroico.

Morpheus- Matrix

A Era das Franquias

O final dos anos 90 começa a dar as bases para o que viria a seguir, no nascimento e estabelecimento da Era das Franquias, um aprofundamento das estratégias consolidadas desde o nascimento do blockbuster moderno.

Ainda que conserve a maioria das características gestadas na geração Spielberg/Lucas, o modelo renovado do negócio das franquias, iniciado já nos dois primeiros anos do século 21 e consolidado nos anos 2010, opera de forma ainda mais monopolista.

As grandes bilheterias das franquias O Senhor dos Anéis, Harry Potter, da trilogia prequel de Star Wars e, posteriormente, dos filmes de super-herói, mostraram que investir em algumas grandes franquias, no lugar de financiar diferentes tipos de filmes (em gêneros e tamanho de produção), era um tiro mais certo. Igualmente certeira era a estratégia de não buscar uma diversificação de centenas de formas diferentes de blockbuster, incluindo aí vários títulos originais, mas sim expandir as franquias já existentes e de grande familiaridade do público, na maioria das vezes agrupando-as nos mesmos grandes projetos.

A Marvel Estúdios/Disney iria apostar ainda mais alto, sedimentando as bases de seu MCU (Marvel Cinematic Universe). Nunca uma proposta cinematográfica do mercado de blockbusters imaginou algo que reunisse tantos filmes e outros produtos audiovisuais, incluindo aí o mercado de streamings que nascia. Ao mesmo tempo, nunca as salas de cinemas haviam presenciado uma fração tão grande de sua ocupação servindo a um só gênero.

Dentro deste processo, outros temas ganham também atenção, como uma possível infantilização do público, a influência de certa “subjetividade nerd” e as relações destes grandes projetos com os processos monopolistas das grandes corporações.

Mas estas e outras questões serão alvo de nossa atenção em uma segunda parte destas reflexões, no texto “A Era das Franquias”.

Gabriel de Barcelos Sotomaior

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* O livro de Peter Biskind serviu de base para a maioria das citações e pesquisa geral para este ensaio. Muitas delas estão diretamente referenciadas, mas como se trata de um texto de caráter mais jornalístico que acadêmico, tomamos a liberdade de não especificar todas as citações, em benefício da melhor fluidez do texto.

** No filme Matinee – Uma Sessão Muito Louca, John Goodman interpreta uma versão ficcional de Castle, em um filme interessante para compreender o clima das sessões de filmes B e filmes de gênero dos anos 50.

Fontes consultadas

Livro Easy Riders, Raging Bullls: Como a geração sexo-drogas e rock’n’roll salvou Hollywood- Peter Biskind. Tradução: Ana Maria Bahiana. Editora Intrínseca, 2009.

Livro Especulações Cinematográficas- Quentin Tarantino. Tradução: André Czarnobai. Editora Intrínseca, 2023.

Reportagem “‘Vingadores: Ultimato’ ocupa quase todas as salas de cinema no Brasil e gera polêmica”- Site CinePop. Escrito por Janda Montenegro.

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